Dragão Negro - Renascimento
“Estranho como a mente traz a nós lembranças em momentos tão diversos... Tão ambíguos a elas. Uma noite fria, em uma fortaleza de aspecto similar à noite. Faz algumas horas desde que voltei da campanha, a qual ganhei liderança de meu mestre. Desde o retorno, me mantive aqui, deitado deixando que as imagens fluíssem.
Lembro-me que foi em uma noite assim onde tudo começou... Um frio cortante, uma Lua pálida, como se ela mesma resguardasse o medo que cairia junto ao crepúsculo. Todos no pequeno condado deviam estar na paz do sono, ou senão, vigiando por essa paz, para que o dia viesse brilhante para todos, e que assim continuasse até a próxima noite. Um ciclo repetitivo, mas que não entediava ninguém. Ao contrário, era motivo de prazer a muitos.
Uma luz, seguido imediatamente de um estrondo tempestuoso. Foram necessários apenas segundos para que toda aquela paz fosse trocada por caos. Crianças eram colocadas com as mulheres dentro de casas e outros abrigos. Homens e jovens estendiam o chamado às armas, enquanto os que chamavam de soldados iniciavam o combate. Entre os jovens, estava eu, assustado e confuso.
Apenas me entregaram uma espada e um escudo, ambos rústicos, mas ainda armas. Ordenaram-me que seguisse a turba em encontro aos invasores. Mas não era isso que devia ser feito. Minha família... Irmãos, mãe... Todos estavam desesperados. Eu queria permanecer com eles, garantir a segurança deles. Porém... Eu estava confuso... “Tudo ficará bem! Eu voltarei!” Era só o que consegui falar, antes que eu seguisse a turba.
A batalha já estava vários passos à frente quando cheguei. A noite. A neblina... O calor da batalha... Tudo estava confuso... Caótico! Eu pouco conseguia definir quem era inimigo ou aliado. Medo... Eu não conseguia nem ao menos levantar as armas... Em um curto momento, tudo ficou escuro. Um golpe certeiro, uma força descomunal, e veio a escuridão.
Depois, imagens confusas entorpeceram minha mente. Gritos, nomes confusos, agonia... Sofrimento, silêncio. O som do sangue sendo derramando, a carne dilacerada, os gritos agonizantes. E novamente silêncio. Eu queria me mexer, mas não conseguia, não me movia, mão respondia a nada! Eu queria levantar... acordar... Correr para minha família...
Acordo tão rapidamente quando caí na escuridão. Confuso e atordoado, olho em minha volta, e me vejo nesse mesmo quarto que estou agora. Assustado, confuso e ferido, tento me levantar, mas em vão. Cáio com muita força no chão, e enquanto tento me levantar, um homem vai até mim, e me levanta, colocando-me na cama novamente. Ele diz que estou muito ferido para que possa andar, e que o melhor seria o descanso. Dias se passam, até que eu volte ao meu normal, e a primeira coisa que logo penso é “Minha família!”.
Novamente tento me levantar, mas antes que eu o fizesse, o mesmo senhor volta a entrar ao quarto. Ele se senta em um banco e me diz a catástrofe: minha terra, meu lar, minha família... Todos queimados... Destruídos pelos saqueadores... Apenas eu sobrevivi, provavelmente dado como morto, até que este me achasse,
Revolta... Fúria... Caos... Vingança... Era apenas isso que corria em minha mente... Logo me vi confuso... Com medo... Entorpecido novamente, assim como foi quando entrei na batalha... A escuridão retorna...
Mais um dia se passa... Eu não podia acreditar... Tudo perdido... Tudo! Vingança! Eu queria o sangue daqueles que haviam derramado o mesmo da minha família! E ainda o quero! Antes que eu pudesse sair do quarto, o homem me ofereceu o que eu queria. Ofereceu-me o treinamento, as armas... O Exército que era dele seria meu agora... Tudo por que tínhamos inimigos comuns, dizia ele. Ele viu em mim a justiça... A força que poderia derrotar aqueles que acabaram com o meu paraíso.
E então, tudo começou aqui... Meu treinamento, meu forjamento á guerra... Em alguns meses, a minha guerra pessoal se estendeu ao continente daqueles que o mestre dizia “invasores”... O nosso inimigo comum... Vitórias... O sangue inimigo foi derramado com a minha lâmina... E assim, me tornei o comandante... O braço direito de meu mestre...
E por que as lembranças são tão ambíguas, você diz? Não por muito... Na verdade o começo de cada uma tem em comum a guerra... Ma o que tornam elas tão estranhas são que... Às vezes, eu me lembro das batalhas que comandei... Os saques... E me vejo não muito diferente daqueles que aniquilaram o condado onde morei...Os gritos de agonia e dor... Tudo volta ao ponto onde eu renasci como guerreiro...
Em várias vezes me vejo uma máquina de guerra... Mas ainda sim há parte de mim que herdou sentimentos daquele jovem assustado que eu já fui... Uma existência ambígua, que torna as lembranças mais confusas ainda...
Mas essa neblina logo se desfaz quando me lembro do sangue derramado injustamente... Das mortes... Da minha família... Minha sede por vingança continua... E o mestre me dá o poder para que a justiça seja feita... Aqueles que um dia acabaram com vidas inocentes vão pagar! Eu agora, alegremente, carrego o nome com qual meu mestre me presenteou... O dragão negro... E os injustos sofrerão sobre a minha chama de vingança...”